O nosso website utiliza cookies por forma a melhorar o desempenho do mesmo e a sua experiência como utilizador. Pode consultar a nossa política de cookies AQUI

Publicado a 19/11/2017

Voltar

Perfis sensoriais e relação com outcomes clínicos

Rui Miguel Almeida Silvestre

Nos últimos anos têm sido estudados os perfis sensoriais dos utentes através do Quantitative Sensory Testing (QST) em várias condições clínicas assim como a relação destes com outcomes clínicos (através de instrumentos de medida auto-reportados). O QST é um protocolo que avalia respostas sensoriais e perceção de dor a estímulos mecânicos e térmicos, sistematicamente aplicados (estandardizados) com intensidades controladas (Rolke et al., 2006).

Através da ativação estandardizada do sistema nociceptivo e dos seus mecanismos é possível avaliar e quantificar a perda e o ganho de função sensorial nas respostas geradas, nomeadamente através da sumação temporal/wind-up ratio (fibras C), limiares de deteção/dor térmicos (fibras A-delta) e limiares de deteção/dor à pressão (Fibras A-beta) (Cruz-Almeida & Fillingim, 2014; Rolke et al., 2006). Moloney et al (2015) pretenderam estudar duas condições clínicas, radiculopatia cervical (RC) e dor no braço de origem não específica (DBNE) (ver tabela 1 – Critérios de Inclusão) e caracterizá-las sensorialmente (Moloney, Hall, & Doody, 2015).

Foram definidos 4 subgrupos de acordo com a perda e ganho da função sensorial através da aplicação do QST e para cada grupo foram observados os detalhes relativamente ao preenchimento de instrumentos de medida como a Leeds Assessment of Neuropathic Symptoms and Signs (LANSS) para avaliar o envolvimento de dor neuropática nas respetivas condições. Um resultado superior a 12 nesta escala sugere o envolvimento de mecanismos neuropáticos na sintomatologia do utente.

No grupo de RC apenas 6 sujeitos (36%) reportaram um score > 12 enquanto que no grupo de DBNE 4 participantes (10%) o fizeram. Quando observamos as respostas da LANSS dos participantes com RC em função dos subgrupos, verificamos que no subgrupo de perda sensorial e no subgrupo de hiperalgesia sensorial apenas 6% e 12% dos participantes, apresentaram o envolvimento de mecanismos neuropáticos, respetivamente. Curiosamente, nos participantes com RC sem nenhuma anormalidade na função sensorial, 12% dos sujeitos também apresentaram envolvimento de componente neuropática. Outros estudos reportaram resultados interessantes. Em 2013 Tampin et al verificaram que apenas 30% dos sujeitos com RC apresentavam um resultado ≥ 19 na escala PainDETECT Questionnaire (PDQ) e portanto maior probabilidade de apresentar uma componente neuropática na sintomatologia (Tampin, Slater, & Briffa, 2013). Contudo, este estudo não mediu os perfis sensoriais e as diferenças destes com outcomes clínicos não foram observadas. Recentemente, Vollert et al (2016) verificaram que dos 61 sujeitos com RC, 30% não apresentavam alteração da função sensorial medida através do QST. Além disso, este estudo observou a relação do score final da PDQ com os fenótipos sensoriais medidos pelo QST (nenhuma anormalidade, perda sensorial térmica, perda sensorial mecânica, perda sensorial mista) em sujeitos com polineuropatia, lesão neural periférica, radiculopatia, neuralgia pós-herpética e neuralgia do trigémio e os resultados mostram que o score final da escala PDQ não é suficientemente sensível para distinguir os tipos de perfis sensoriais em sujeitos com dor neuropática (Vollert et al., 2016).

 

Conclusões:

1. Os resultados sugerem que existem diferenças nos perfis sensoriais dos utentes quer com RC quer com DBNE requerendo diferentes abordagens na tomada de decisão clínica;

2. Dentro de um grupo com a mesma condição clínica poderão existir vários subgrupos que necessitarão de abordagens de tratamento distintas de acordo com o perfil sensorial existente;

3. Parece não existir relação entre o que os utentes reportam e aquilo que realmente sentem;

4. São necessários instrumentos de avaliação válidos que consigam medir os perfis sensoriais na prática clínica;

 

 -----

Bibliografia

  • Cruz-Almeida, Y., & Fillingim, R. B. (2014). Can quantitative sensory testing move us closer to mechanismbased pain management? [Research Support, N.I.H., Extramural Review]. Pain Med, 15(1), 61- 72. doi: 10.1111/pme.12230
  • Moloney, N., Hall, T., & Doody, C. (2015). Divergent sensory phenotypes in nonspecific arm pain: comparisons with cervical radiculopathy. [Comparative Study Research Support, Non-U.S. Gov't]. Arch Phys Med Rehabil, 96(2), 269-275. doi: 10.1016/j.apmr.2014.09.015
  • Rolke, R., Magerl, W., Campbell, K. A., Schalber, C., Caspari, S., Birklein, F., & Treede, R. D. (2006). Quantitative sensory testing: a comprehensive protocol for clinical trials. [Evaluation Studies Research Support, Non-U.S. Gov't]. Eur J Pain, 10(1), 77-88. doi: 10.1016/j.ejpain.2005.02.003
  • Tampin, B., Slater, H., & Briffa, N. K. (2013). Neuropathic pain components are common in patients with painful cervical radiculopathy, but not in patients with nonspecific neck-arm pain. [Comparative Study]. Clin J Pain, 29(10), 846-856. doi: 10.1097/AJP.0b013e318278d434
  • Vollert, J., Kramer, M., Barroso, A., Freynhagen, R., Haanpaa, M., Hansson, P., . . . Baron, R. (2016). Symptom profiles in the painDETECT Questionnaire in patients with peripheral neuropathic pain stratified according to sensory loss in quantitative sensory testing. Pain, 157(8), 1810-1818. doi: 10.1097/j.pain.0000000000000588

CV: Fisioterapeuta pela Escola Superior de Saúde Dr. Lopes Dias (IPCB) e Mestrando em Disfunções Músculo-Esqueléticas pela Escola Superior de Saúde de Setúbal.

Partilhe em...